Os desafios e as alegrias de estar à frente do CEA

Quando o assunto é anglicanismo, o Centro de Estudos Anglicanos (CEA) é, sem dúvidas, um dos principais pólos de formação do Brasil. O CEA foi criado em 1997 pelo Sínodo da IEAB. A ideia era ter uma instituição capaz de articular a formação teológica anglicana em nosso país, seja por meio de cursos, formações livres, publicações, eventos, etc.
Hoje, à frente de todo este trabalho está a reverenda Lucia Dal Pont, no cargo de coordenadora geral do CEA. Nascida em Sombrio, litoral Sul de Santa Catarina, é filha de mulher e homem agricultores, Gilio Dal Pont e Olga Estevam Dal Pont. Criada na roça, foi para São Paulo aos 16 anos, junto de uma tia, que era uma freira católica. 
“Saí em busca de algo que ainda não sabia muito bem o que era, mas tinha certeza de que era relacionado à missão de Jesus. Eu queria ser missionária! Na realidade, eu queria ser padre, mas como nasci menina, na Igreja Católica Romana minha vocação jamais poderia ser concretizada”, contou a reverenda.
Hoje presbítera da IEAB, dos 18 aos 28 anos trabalhou como assessora leiga, liberada (com salário) para assessoria em paróquias, Área Pastoral e em missão em outras terras. 
Reverenda Lucia é teóloga com especialização em Bíblia, e atualmente está em fase de encerramento do seu mestrado em teologia bíblica. Possui ainda especialização em Liturgia, Educação Cristã e Pastoral da Juventude. E é com ela o nosso bate-papo sobre missão. 
Boa leitura.
  1. Reverenda Lucia, é sempre um grande prazer falar com você! Conte para nós como começou a sua trajetória na IEAB? 
Minha trajetória na IEAB iniciou quando descobrimos que não cabíamos mais dentro da instituição religiosa em que atuávamos. Trabalhei três anos em uma paróquia, com um  padre Franciscano Capuchinho, Luiz. Até que ele foi transferido para uma missão fora do país. Neste momento, percebemos que nossa relação de companheirismo e de trabalho tinha se tornado algo mais profundo, afetivo. Depois de muitas reflexões, decidimos que nosso caminho era conjunto, parceria de vida. Na Igreja Católica Romana não seria possível viver esta parceria por conta do celibato. Luiz, o frei, tinha profunda certeza de que era vocacionado ao ministério ordenado. E eu poderia contribuir muito ainda na ação pastoral dentro na missão de Jesus, enquanto cristã, tendo uma Igreja como instrumento de ação. Eu tinha certeza de minha vocação. Na paróquia onde trabalhávamos, fazíamos muitas atividades em conjunto com a IEAB. Dois anos depois Luiz voltou para o Brasil, e quando fomos conversar com o reverendo daquela paróquia sobre nosso desejo e nossa situação, ele nos acolheu com muito carinho, nos acompanhou com muito cuidado e nos ajudou a fazer todo processo. Nos adaptamos muito bem. Depois do período de imersão no anglicanismo e muitos encontros, as Ordens do Luiz foram reconhecidas pela IEAB, e eu iniciei meu processo de preparação para o ministério ordenado. Fui ordenada em 2003, na área Missionária em Concórdia, Santa Catarina, onde estávamos trabalhando à época.
  1. Hoje, você está à frente do Centro de Estudos Anglicanos (CEA), uma instituição vinculada à nossa IEAB, e que dá formação não apenas para pessoas anglicanas, mas também de outras confissões religiosas interessadas no “modo de ser anglicano”. Pode nos explicar um pouco mais sobre as ações do CEA, seus objetivos e principais desafios?
O objetivo do CEA é cuidar de toda formação teológica da Igreja, e está ligado diretamente à Junta Nacional de Educação Teológica, JUNET. O CEA é o braço executivo da JUNET. Temos como base o Planejamento Estratégico Provincial, dentro do eixo específico da formação. No CEA, estamos trabalhando com três setores distintos, mas unidos entre si, um colegiado. Os setores são: Acadêmico, Publicações e Formação Permanente. Cada uma das pessoas que coordenam um setor também é responsável pela formação em cada uma das três Áreas da Província. Neste tempo, estou como coordenadora geral do CEA. Mas em cada setor existe uma pessoa liberada para estes serviços. 
No setor Acadêmico, temos a reverenda Carmen Etel, com ajuda de duas pessoas na assessoria. Ligado a este setor está o curso de Imersão em Anglicanismo, onde atendemos pessoas da IEAB do Brasil, Portugal e Moçambique. O curso também é aberto a não anglicanos, com divulgação ampla pelas redes sociais para quem desejar. Estamos também em processo de organização da Faculdade Anglicana.
Setor Publicações: cuida de todas as publicações e tudo que compreende este serviço, tendo como apoio uma Equipe Editorial. Também está sob seus cuidados o serviço de comunicação do CEA. Reverendo Bruno é o responsável, com duas pessoas de apoio.
Setor de Formação Permanente: este setor é o que está ligado diretamente às Dioceses através dos organismos diocesanos, Centro de Educação Teológico, CET. Através destes serviços diocesanos traçamos linhas de ação formativa a partir do Plano Nacional de Educação Teológica, que vai da base até o CEA, respeitando as especificidades de cada Diocese e Distrito Missionário. Este setor também cuida das formações em nível Nacional, promovendo formações e articulações. Eu sou responsável diretamente por este serviço.
Nossos desafios maiores são: a) Dar conta das demandas necessárias para que possamos ter uma Igreja forte e articulada nestes serviços; b) Fazer com que o Plano Nacional de Educação de Teológica (PNT) seja colocado como pano de fundo de todas as ações nas Áreas e em nossas Dioceses, de modo que possamos ter linhas de ação conjuntas e c) Neste tempo de pandemia, o desafio é mantermos uma formação de qualidade e contínua. 
  1. Estando à frente do CEA, quais são as suas principais atribuições lá, e como você estabelece pontes entre o Centro, as Dioceses e a IEAB como um todo?
Minhas atribuições dentro do CEA são: a Coordenação Geral, responder pelo CEA, articular toda essa rede de organismos. Para isso, tenho a parceria das pessoas que coordenam os Setores e as Áreas Pastorais da Província que mencionei acima. Também nesta parceria estão as pessoas que coordenam os CETs, Centro de Educação Teológica de cada Diocese. Contamos com muitas pessoas que nos ajudam na assessoria. A professora Carmen Regina, que atua como assessora pedagógica do CEA, e o reverendo. Rodrigo Espiúca, que nos ajuda na coordenação do eixo de formação no Planejamento Estratégico, junto com o bispo Maurício Andrade, presidente da JUNET. Lembro também da parceria da secretária-geral da Igreja, bispa Magda Guedes, que também tem este cuidado com a formação. Bispo Naudal, primaz da igreja, que ousou promover um trabalho em conjunto entre CEA, SADD e Secretaria Geral, e a própria JUNET, que nos estimula e nos dá condição de trabalho. Se não fosse por estas parcerias, esta rede onde tudo está interligado, jamais conseguiríamos.  
  1. A gente percebe um carinho muito grande em tudo que você faz ali no CEA. É nítido o seu envolvimento com esse trabalho educacional, formativo. O que mais te motiva nessa área?
O que mais me motiva é saber que a educação é que traz transformação para as pessoas, mas não qualquer formação: precisa ser uma formação que liberta, que estimula, oferece instrumentos de transformação do ser humano, para que o ser humano venha transformar as instituições. Venho da educação popular, sou uma apaixonada por Paulo Freire, Leitura Popular da Bíblia e tudo que possa ajudar neste caminho de base… Nossa Igreja é uma instituição que está em movimento e busca transformação, isso traz animação para ousar neste caminho da formação. Bebo na fonte profunda do Jesus de Nazaré, o Jesus histórico, aquele filho de Maria que caminhou pelas periferias do seu tempo, que formou um grupo de homens e mulheres a seu modo para estarem no discipulado com Ele. Sofreu pena de morte e foi crucificado pelos poderes de seu tempo. É esse Espírito que me motiva no envolvimento do trabalho. 
  1. Gostaria de acrescentar algo?
Agradecer a oportunidade de permitir que eu expressasse meus pensamentos e sentimentos, pois quando escrevemos algo, não estamos alheios ao que pensamos, mas deixamos nossas marcas. Gratidão.