Pessoas leigas ajudam a trazer perspectivas cotidianas à Igreja
Mara Luz e Salem Saloom
Se você frequenta celebrações anglicanas e assume que o pregador ou a pregadora sempre usa um colar clerical, está na hora de conhecer experiências feitas em comunidades por todo o mundo no sentido de dar voz às lideranças leigas – seja no âmbito das formações, pregações, e em muitas outras atividades possíveis.
Salem Saloom, 74 anos, é um exemplo disso. Ele prega uma vez por mês na Igreja Episcopal de Santo Estêvão, no Alabama, EUA. Embora nunca tenha frequentado um seminário, Saloom completou um curso de pregação leiga na escola de sua Diocese local (clique aqui para entender melhor). No momento, está participando de uma espécie de “estágio” – que dura dois anos – para colocar em prática tudo aquilo que aprendeu.
Além de servir sua igreja, Saloom é cirurgião, agricultor de árvores e amante da vida ao ar livre. Ele disse que se baseia nessas experiências quando escreve seus sermões. “Acho que todo mundo, não importa se é ordenado ou leigo, traz algo especial para a mesa, e tem que ser de suas próprias experiências e de sua própria maneira de ver e fazer as coisas.”
Cada vez mais comum
“A voz e as ações das pessoas leigas são fundamentais para a diversidade viva nas nossas comunidades. Elas dinamizam a vida comunitária, assumindo múltiplas responsabilidades, trazendo novos temas, animando os planejamentos. Uma dimensão que se faz atual é a participação também nas pregações, e não apenas quando estudaram teologia”, reforça Mara Manzoni Luz, liderança leiga da Paróquia Anglicana da Santíssima Trindade e integrante da equipe de Planejamento Estratégico da Diocese Anglicana de São Paulo.
À medida que algumas congregações renunciam ao clero em tempo integral e as pessoas leigas assumem mais responsabilidades paroquiais, algumas Dioceses começam a incentivar que leigas e leigos elevem suas vozes ao púlpito. “As Dioceses estão reconhecendo o valor da pregação leiga”, conta o reverendo Charles Cesaretti, presidente da Episcopal Preaching Foundation. “A pregação leiga sempre esteve na igreja. Começa no livro de Atos, então, está em nosso DNA”, completa.
Unidade de propósito
Preparar e capacitar lideranças leigas a assumir novos desafios na igreja é uma forma de “envolver pessoas”, ao invés de tê-las apenas como ouvintes passivas da palavra. A boa notícia é que, de modo geral, essas pessoas mostram cada vez mais vontade de ajudar a orientar as congregações, incluindo aí serviços como os de acolhida, formação, etc.
Atuante na Diocese Meridional da IEAB, a leiga anglicana Rita Fortes Zanin concorda que dar voz aos leigos e às leigas também é uma forma de tornar a igreja mais plural. “É no grupo, na convivência com as outras pessoas, que nós aprendemos… que nos enriquecemos, sem, contudo, perdermos a nossa individualidade. Na igreja não é diferente! É nessa troca que crescemos espiritualmente, que nos tornamos mais fortes”, explica.
Na opinião de Paulo Ueti, teólogo anglicano não ordenado e responsável por diversas formações de leigos, leigas e, também, do clero, “as lideranças religiosas são chamadas a reconhecer que as pessoas não ordenadas ou que não são líderes têm voz (muitas vezes silenciada) e é preciso promover espaços e metodologias onde as suas vozes tenham lugar e sejam ouvidas. E como uma pessoa não ordenada, penso que devemos exigir esse reconhecimento em qualquer espaço, mas especialmente nos espaços religiosos. Certamente, quanto mais vozes circulam, mais plural a igreja se torna”.
Palavra encarnada na realidade cotidiana
As congregações ainda se beneficiam de ouvir uma maior diversidade de temas a partir de leigas e leigos, isso porque a pessoa leiga tende a pregar mais sobre a vida cotidiana, o “preço do leite”, a dificuldade de “abastecer o carro com a gasolina caríssima”, e por aí vai.
“Percebemos que leigas e leigos têm muito a dizer uns aos outros, especialmente quando estamos passando por situações mais delicadas, como é o caso da pandemia”, afirma a reverenda Joy Blaylock, missionária anglicana residente nos Estados Unidos. Ela acrescenta que pessoas leigas “têm uma perspectiva totalmente diferente para trazer, o que anima e dá esperança de uma forma muito diferente, de uma maneira bonita”.
Nem todo mundo pode se sentir confortável para falar diante de uma congregação, mas Saloom diz que sente um chamado pessoal para este ministério. “Todo mundo tem um ministério, quer saibam ou não, e a pregação pode ser um desses ministérios”, encerra.
Fonte: IEAB com informações do ENS Foto: ENS / Acervo Pessoal